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segunda-feira, 29 de março de 2010

"Seja carinhoso com a massa do pão"

"Seja carinhoso com a massa do pão" é o título de um artigo publicado no jornal brasileiro "Estadão". Dá umas boas dicas sobre como não errar a fazer o pão, sugerindo inclusivé que não se usem receitas que digam "xícara" (ou chávena, em Portugal) porque o tamanho da chávena que se usa acaba por ir alterar as quantidade utilizadas na receita original.

Concordo com isso e a partir de agora irei evitar usar como medida a palavra "chávenas" e passarei a utilizar as unidades do Sistema Internacional (SI), o Kilograma para "pesos", e a unidade aceite pelo SI, o Litro para medir volumes.

Curiosidade de Física:
O Litro, embora não pertença ao SI, é aceite devido ao seu uso generalizado no quotidiano.
Digo "pesar" entre aspas porque em Física diz-se que o Kilograma está associado à massa de um corpo e não directamente a um peso (Peso = massa x força gravítica, de acordo com a 2ª Lei de Newton) e eu não queria que confundissem o termo massa de Física com o termo da massa do pão :)

Se alguém tiver curiosidade sobre o Sistema Internacional de Unidades, pode consultar a wikipedia aqui.

Mas voltando ao tema que me levou a escrever este post, o artigo do jornal brasileiro "Estadão", que cito aqui na íntegra para poder partilhar com vocês.



Seja carinhoso com a massa do pão
Dar verdadeiras surras na mistura pode estar se tornando coisa do passado. Respeitáveis padeiros profissionais concluíram que não é necessário maltratar tanto a massa (e o preparador) para se ter um bom produto caseiro
25 de março de 2010 | 10h 18

'Não há delícia maior do que cortar um pão e perceber os sinais de uma fermentação exuberante'

Quando comecei a fazer pão, nos anos 70, o pão comum da receita do Beard on Bread, de James Beard, ou o pão contracultural de The Tassajara Bread Book, punha a mão na massa, resistente e elástica, que devia ser sovada por 10 a 15 minutos.

Nos anos 90, amassei horas a fio enquanto aprendia a fazer os pães meio ácidos e crocantes da Acme Bread Company, a começar pela receita que o fundador da empresa, Steve Sullivan, forneceu para o Chez Panisse Coking.

Hoje fico imaginando o que poderia ter feito durante todas aquelas horas. Os livros de receitas de pão que dizem que não é necessário sovar muito não são novidade, mas na safra atual há várias receitas de respeitáveis padeiros profissionais que concordam que não é preciso trabalhar muito a massa para obter um bom pão caseiro. Eles proclamam as virtudes das massas excessivamente úmidas e pegajosas, que nada têm a ver com aquelas elásticas do passado.

O que aconteceu com o conceito de que amassar longamente o pão ajuda a espalhar uniformemente as proteínas do glúten da massa, tornando-a mais elástica e capaz de crescer mais, produzindo um pão mais leve? Será verdade que com menos trabalho é possível fazer um pão melhor?

Para me convencer disso, preparei diariamente variações dos mesmos pães durante algumas semanas - firmes e úmidos, bem amassados ou não. Depois, ouvi a opinião profissional de Michel Suas, fundador do San Francisco Baking Institute. Ele experimentou o início de um processo artesanal para preparar um pão que estava morrendo em seu país. Aqui ficou e trabalhou com colegas como Sullivan e Nancy Silverton, da La Brea Bakery.

Meus experimentos me ajudaram a esclarecer várias coisas. Suas explicou que assim como os pães dos supermercados de hoje, o pão caseiro dos anos 70 copiava o método inglês de fazer pão de fôrma - com um interior firme, uniforme, de massa fina, ideal para sanduíches compactos.

Segundo ele, os pães rústicos resultam melhor com a massa mais mole, mais úmida e a manipulação delicada para preservar as bolhas de gás que se formam durante a ação do fermento. A teia de glúten elástica vai se formando lentamente à medida que a massa cresce, e o padeiro interfere ocasionalmente, pegando-a pelas bordas e dobrando-a sobre si mesma.

Algumas massas úmidas podem ficar ótimas se manipuladas. É o caso da de farinha de trigo integral na versão mais recente de Amy’s Bread, de Amy Scherber e Toy Kim Dupree, publicado pela John Wiley & Sons. Os grãos integrais tendem a absorver mais água e a produzir uma teia de glúten menos elástica - descobri que a manipulação, como a receita recomenda, dava um pão mais leve. As receitas desse livro se aproximam das massas úmidas, delicadamente trabalhadas.

Pessoalmente, não fiquei satisfeito com nenhuma massa úmida que tentei fazer. Embora algumas mantivessem sua forma e resultassem em belos pães, outras achatavam e viravam uma espécie de focaccia, com a crosta fina e o interior grosseiro.

Segundo Suas, as receitas que não deram certo eram úmidas demais. "A água não contribui em nada para o sabor nem para a estrutura; portanto deve ser apenas suficiente para amalgamar a farinha", diz. Ele recomendou receitas com menos de 75% de hidratação: uma quantidade de água que corresponda a 75% ou menos do peso da farinha. A hidratação que ele prefere para uma massa fácil de trabalhar, e que produz um pão bem aerado e crocante, é 68%. Algumas receitas que experimentei ultrapassavam os 90%. O pão básico de James Beard usava 60%. Então, as massas com certa umidade e que exigem pouca ou nenhuma manipulação podem dar pães deliciosos.

Mas cuidado com outras ideias "revolucionárias" que não passam de atalhos usados pela indústria. "Aumentar a quantidade de fermento para acelerar a fermentação é péssimo para a qualidade do pão", explica Suas.

Entre os livros mais recentes cujas receitas experimentei, o mais famoso de Jim Lahey, My Bread, funde uma técnica brilhante baseada em três pontos: uma massa úmida que pode ser bem misturada sem sovar; uma fermentação prolongada e lenta com apenas 1g de fermento, para que seu sabor não predomine; e deixar a massa fermentada em uma panela aquecida com tampa, que aquece a massa rapidamente e prende seu vapor aumentando seu volume. Artisan Breads Every Day, do padeiro e professor Peter Reinhart, é um lúcido compêndio de propostas modernas.

Não há delícia maior do que cortar um pão que acabou de sair do forno e perceber os sinais de uma fermentação exuberante.

PARA NÃO ERRAR

Massas úmidas

As bem hidratadas e não trabalhadas podem dar um pão bem gostoso. Manipular a massa durante 10 ou 15 minutos não modifica o resultado

Massas firmes

Ficam ótimas se sovadas durante alguns minutos, mas só porque isso ajuda a misturar a farinha por igual com menor proporção de água. A manipulação prolongada não fez muita diferença nos pães depois de prontos

Massa firme e bem sovada

Produz um ótimo pão para sanduíches, mas não a parte interna aoveolada dos pães "rústicos"

Outras dicas

Procure receitas que dão os pesos dos ingredientes e evite medir em xícaras e colheres

Divida o peso total do líquido pelo peso total da farinha. Se o resultado for superior a 0,75, seu pão ficará achatado

O sal é essencial para um bom aroma e gosto. A massa úmida precisa de mais sal do que as firmes, cerca de 2% do peso da farinha

É mais fácil obter um interior aerado com pães de forma alongada ou pãezinhos, em vez de um grande e redondo - e essas formas rendem uma crosta maior

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